sábado, 19 de março de 2011

Fênix


Uma querida amiga está no hospital. Ela luta contra um câncer há alguns anos. É jovem, bonita, tem um marido que ama e uma filha que ilumina seus dias.

Acompanhamos nesses anos a sua brava batalha com imensurável admiração e orgulho. Aquele corpo franzino, já derrubou vários decretos da medicina com sua alma de leoa. Simplesmente rasgou os prognósticos que afirmavam, sentenciavam e assustavam.

Não foi uma nem duas vezes. Foram várias.

Agora ela está lá de novo. Naquele quarto inóspito, com cheiro de álcool gel e cores pastéis. Os decoradores de hospitais acham que são cores próprias para esses momentos.

No caso da nossa querida amiga, isso é um ledo engano. Ela merece paredes cor de carmim, flores multicoloridas em um vaso vistoso e lençóis de cama tão bonitos quanto os seus olhos azuis.

Sua alma é assim.

Um tempo atrás escrevi sobre a admiração que tinha por essa pessoa. Foi em fevereiro de 2010, no post “Tão rara”. Naquela época as coisas ficaram complicadas. E mais uma vez ela deu a volta por cima.

Conversando agora há pouco no telefone com minha irmã, decidimos ir à Porto Alegre passar um dia com ela na semana que vem. Quero levar na mala a medalha de Nossa Senhora que ganhei de uma vizinha-amiga.

O amuleto acompanhou essa querida vizinha quando o marido sofreu de um câncer complicado. Daí, quando a Sofia estava no hospital, ela achou por bem me dar.

Era véspera da cirurgia. Situação mais que crítica. A Sofia com menos de dois quilos, com infecção hospitalar e sem chance de esperar mais um dia para se operar.

Completando o quadro da dor, eu estava internada em um quarto do mesmo hospital, infectada por outra bactéria gravíssima, com mil e um cuidados.

Na entrada do bloco cirúrgico o Nauro entregou a medalha na mão de uma das enfermeiras que seguiu com ela e recomendou que trouxesse de volta. A Sofia e a medalha!

Durante a anestesia, ela teve uma parada cardiorespiratória. O médico ficou dois minutos massageando aquele minúsculo corpinho. Quando estava quase desistindo, a Sofia voltou. E o mais incrível: sem seqüela neurológica.

Por isso hoje, quando falei com minha irmã, não tive dúvidas. Preciso passar a medalhinha a diante. E para quem tem alguma dúvida de que milagres existem, eu conto que nesse instante tem uma menina peralta, de cinco anos, dando cambalhotas em cima da cama.

Amiga Neca, segura firme que estamos chegando na quarta-feira para passarmos o dia juntas. Vamos dar boas risadas e colocar a medalhinha bem perto do teu coração.

A força da vida é algo inexplicável. E a medicina cada vez mais se curva para essa verdade que transforma os destinos.

Teu poder de fênix é a maior prova disso!

terça-feira, 1 de março de 2011

Tempo

Fiquei um tempo longe do blog. Não tirei férias do trabalho. Ser autônomo tem dessas coisas. Algumas vantagens, mas também a necessidade de administrar o tempo no revés do calendário.

E já que tive de continuar na labuta, optei por me dar um tempo. Nessa pausa íntima, fiquei bem quietinha, espiando as frestas do cotidiano. Deliciosos momentos comuns, que no correr dos dias nos escorrem pelas mãos.

Olhei para a Sofia no mágico reboliço das primeiras férias de sua vida. As tardes andando no balanço de corda, os banhos de arroio, os cabelos dourados irradiando a grama verde. Vi o quanto cresceu minha pequena. Já não é mais nossa bebezinha. Enxerga o mundo. Questiona. Nos pega de surpresa.

- Como surgiram as estrelas mamãe?

E lá vamos nós, as duas para a internet. Eu com receio da imprecisão, recorro à tecnologia. Expliquei a ela que a mamãe não sabe de tudo, mas que por sorte, hoje temos o Google para dar uma mãozinha (ou azar!).

Também tive tempo para ver mais de perto as características tão próprias do meu marido. A força bruta que em um dia de folga vira cimento e constrói uma churrasqueira é também de pura sensibilidade. São dele as mesmas mãos que mergulham a máquina fotográfica no detalhe do dia que se esvai.

Vem da alma esse olhar que congela instantes magníficos do cotidiano. Muitas vezes não tenho tempo de apreciar essa metamorfose tão singular. Tão ele.

Enxerguei com carinho, os cantos do nosso espaço. Essa casa feita de retalhos da nossa história. Repleta de cores e símbolos, de gente que passou mas ficou. Como disse nosso amigo Sancler, mais parece cênica.

E foi caminhando por esse cenário tão nosso que vi o quanto o jardim plantado em grande parte pelo Nauro e pela Sofia, já dá frutos. Comi o primeiro caqui que nasceu no calor desse verão.

Vi os brotos de pitanda e o florir prematuro do maricá. Sinal de inverno rigoroso, como dizem os antigos. Teve gosto da mais pura felicidade.

Encontrei tempo para tardes ociosas e bolo morno. Li alguns livros que estavam a minha espera na estante. Viajei pela literatura de Isabel Allende, descobri novos autores e me peguei sonhando em um dia publicar uma obra minha.

O verão já está com cara de outono. Amanhã recomeçam as aulas da Sofia. O cotidiano vai atropelar muitos detalhes que temos a sorte de enxergar mais de perto quando estamos desconectados.

Como tudo na vida, tem os dois lados da moeda. A correria começa e com ela nosso radar fica atento, apontado para todos os lados. Nos debruçamos em semear, arar a terra para plantar mais sonhos. É um ciclo e cumpri-lo está na nossa essência.

Que venham então os assuntos da vida e sirvam de inspiração para nossos deliciosos encontros por aqui. Nesse espaço virtual, onde tudo é permitido. Desde não saber como nascem as estrelas, até a liberdade para daqui se ausentar!