sábado, 22 de junho de 2013

Desejos mágicos


Quando eu era pequena, ficava imaginando que um gênio da lâmpada iria vir perguntar qual poder mágico eu gostaria de ter.

Tive essa ideia por volta dos seis anos e minha resposta imediata ao homem da garrafinha seria o poder da invisibilidade. Queria poder estar nos lugares, sem ser vista. Nas conversas de adultos, aprontar qualquer coisa e jamais ser descoberta.

Lá pelos nove anos, minha urgência era ver o mundo além das fronteiras da Charqueada. Ansiosamente, a mágica seria de voar pelos céus. Levitando nas nuvens, eu dançaria lá em cima, olhando bem de perto as cores do arco-íris.

A adolescência me fez parar de pensar em coisas de criança. Mas lá no fundinho eu sonhava com um pozinho mágico que me faria a guria mais encantadora do recreio do colégio.

Imagina que falta de originalidade. Típico da idade!

Aos 20 eu queria tocar o mundo com meus pés e não esperei pelo gênio. Peguei minha mochila e tomei o rumo além do Atlântico. Esqueci de vez a brincadeira dos desejos mágicos. Me achava a pragmática, super decidida.

A vida rolou no seu ritmo e aquela ideia se perdeu nos anos seguintes. Até hoje pela manhã.

Dia 22 de junho passou a ser uma data marcante na minha vida. Há dois anos meu pai se foi apressado. Sem despedidas, nem avisos. Evaporou do nosso convívio.

Estranho demais essa tal de morte.

Viver o fluxo da vida sem esse cara que me deu tantas características suas, não foi tão simples assim.

Aos poucos compreendemos, mas nunca nos adaptamos.

E hoje, quando cheguei em casa, me ocorreu essa lembrança. Sentada no trapiche, nessa manhã ensolarada, lembrei do gênio.

Foi lá, olhando para aquela água prateada. Na beira do arroio onde ele pediu para “morar”, onde estão suas cinzas. Me veio na mente aquele gênio!

De imediato recordei as tantas ideias que tive ao longo de cada idade. Afinal de contas, tive uma relação estreita com o esse ser imaginário. Trocamos confidências nunca antes reveladas.

E foi aí que decidi fazer um pedido. Mesmo passando dos 40, achei que o gênio poderia relevar minha alma criança e quem sabe atender.

Sem cerimônia, pedi que ele criasse um telefone para eu ligar para o céu.

Eu queria falar com meu pai. Só uma vez mais!

Contaria que estamos bem, mas que não nos acostumamos sem ele.

Ele ficaria faceiro em saber que a Sofia completou oito anos na terça passada. Contaria detalhes do aniversário. Tentaria traduzir o quanto especial está essa neta mimosa, cada vez mais firme e forte.

Ah, e a mãe! Ele daria gargalhada ao saber que finalmente ela se animou a fazer o Caminho de Compostela. Sim, a mãe virou mochileira. Obviamente eu contaria os bastidores dessa viagem e daríamos muitas risadas.

Sempre nós os dias implicando com a mãe, óbvio!

Imagina quando eu contasse sobre o livro do Nauro. Que aquela história que ele adorava repetir, sobre o naufrágio do Nico, acabou virando um livro. E o livro vai virar filme...

Ele pegaria demais no pé do Nauro, típico dele!

O gênio teria que pagar uma conta bem alta nesse interurbano. Não teria como abreviar nada. Nossa saudade é urgente e infinita. Eu teria tanta coisa para dizer ao meu pai hoje.

A saudade é um sentimento estranho. Ela está sempre ali, mas às vezes cutuca o coração da gente mais forte.

Vez que outra vira angústia. Outras vezes é risada, tema para causos, nos faz até falar sozinho. 

Por isso seria tão bom se nossos desejos mágicos pudessem virar verdade. Pelo menos uma vez, para amenizar um pouco.

Enquanto o gênio não aparece, vou aproveitar esse dia inteiro para lembrar o quanto tive sorte de ter um pai tão especial.

Saborear essa saudade, em vez de sofrê-la!