sábado, 16 de outubro de 2010

Carta ao novo(a) presidente


Escrevo como quem larga palavras ao vento, eu sei. Mas mesmo assim Sr(a). novo(a) presidente, não vou me furtar de enviar-lhe essas palavras tão sinceras.

Sempre gostei da política. Talvez porque tenha vindo ao mundo no polêmico ano de 1968. Sai do conforto do ventre materno, para um mundo que convulsionava em meio a históricos acontecimentos que sacudiam certezas.

"...no tempo em que os sonhos começavam a se realizar e até as utopias deixavam de ser utopias..." como disse Zuenir Ventura.

Era um ano enigmático, marcado pelo assassinato do maior líder negro da história, ao mesmo tempo em que a Guerra do Vietnã decepava a paz. Talvez apenas por isso, eu ainda carregue comigo um gosto estranho pela política.

Sempre imagino a cena de minha mãe amamentando, e ao mesmo tempo ouvindo no radinho de pilha as últimas notícias das manifestações estudantis que revolucionavam o centro do país. Estudantes na rua que assustavam as mentes autoritárias.

E assim o tempo foi passando.

Enquanto o minuano soprava aqui nas bandas do sul, vi pela televisão a contagiante mobilização pelas Diretas Já. Meu corpo tomava novas formas e a tal da adolescência chegava. Logo depois desabrochei para a juventude e pisei deveras no mundo democrático, votando pela primeira vez.

Lembro com orgulho daquele dia 15 de novembro de 1989.

Depois disso, nunca mais deixei de expressar meus ideais políticos. Mesmo que muitas vezes tenha me custado calorosas discussões familiares. Meu pé no mundo profissional também foi em um ambiente permeado de sonhos. O primeiro emprego como jornalista foi na assessoria de imprensa política da Prefeitura Municipal de Pelotas/RS.

Respirei o jornalísmo político por cerca de cinco anos, até que minha filha Sofia nasceu, e com sua sabedoria - implícita até no nome - mudou o rumo das coisas.

Mesmo desconectada do cotidiano desta roda-viva, sempre mantive um dos olhos abertos. E assim muita água rolou por debaixo da ponte, trazendo à tona uma política míope e distorcida.

Mas confesso que mesmo com tantos dissabores, como os recentes escândalos do Planalto, ainda guardo dentro do peito um fio de emoção. Um sentimento que ganha força quando ouço um discurso mais carregado de certezas. Aquele conjunto de palavras, ditas com tal contundência, que nos fazem acreditar nas mudanças.

Mas ando deveras descrente nos últimos tempos. E por isso Sr(a). novo(a) presidente, escrevo esta singela carta como forma de fazer as pazes com a política.

Sou uma brasileira que, assim como a maioria, canta o hino nacional quase que por inteiro. Volta e meia acabo tropeçando. Por mais lindo que seja, às vezes troco alguma estrofe. Estou confessando uma coisa muito íntima, com a esperança de que a sinceridade seja uma recíproca entre nós.

Mas não fique preocupado(a), em contrapartida, pago os meus impostos em dia. E olha que não são poucos. Tenho uma pequena agência de comunicação, e lhe digo que não é barbada fazer o cheque no início do mês para pagar os tais "tributos". Sempre me deparo com um número com mais de três dígitos. Mas faço sem reclamar, e por isso me sinto mais a vontade em lhe dizer algumas palavras.

Quero deixar bem claro entre nós, que deposito no meu voto a esperança de que se varra de Brasília esse latente espírito de impunidade. Assim como nossos pais nos colocaram limites na infância, é a hora de alguém puxar as orelhas dos que não aprenderam até agora a ser “bem educados”.

Também vai nele, minha certeza de que a economia tem que ser cada vez mais forte, e que nosso salário tem que ter valor de verdade. Meu voto é também lembrando que os que têm fome, também têm pressa, e que a saúde precisa cuidar de seus doentes.

Meu voto sempre será a minha voz. Minha certeza de que mesmo com tantas coisas erradas nos últimos tempos, a democracia sempre será o melhor dos ganhos. E por isso Sr(a) novo(a) presidente antecipei minhas férias, agendadas com tanto carinho. Tudo isso para voltar a tempo de votar no dia 31 de outubro.

Não quero e não posso me isentar de usufruir desse direito conquistado com tanto sangue e suor. Acho que isso deve estar no sangue dos que nasceram no “ano que não terminou”. Porque como disse Martin Luther King, o que me preocupa não é o grito dos maus. É o silêncio dos bons!

3 comentários:

Janice Coelho disse...

Um texto pra ser aplaudido !
Parabéns Gabi.
Que o dia 31 termine com um saldo de inteligencia!

Anônimo disse...

Que coisa a nossa sintonia...no dia 3 de outubro conversávamos aqui em casa sobre como mudou o cenário político sob o nosso ponto de vista e como sumiu aquela gana de votar que tínhamos há algum tempo. Lembrávamos de como era prazeroso o ato de votar, jamais deixávamos de exercitar esse direito conquistado com toda a alegria do momento. Nos encontrávamos já pela manhã, pois nunca deixamos de votar juntas. Inclusive a Rafa, que era pequena, nos acompanhava com orgulho e satisfação pela luta, depositando o "nosso" voto nas urnas. Quantas discussões travadas em família e tantos riscos do ponto de vista profissional. Mas o orgulho de poder votar em alguém em quem confiávamos era bem maior. Tantos dias do teu aniversário comemorados duplamente. E hoje???? Que sejas atendida amiga!!!!
Beijão,
Dica.

Anônimo disse...

Filha, mais uma vez não vou me furtar de compartilhar deste clamor que está dentro de nós...a esperança com um resto de melancolia. Teu texto reflete a mais pura verdade, como bem me conheces, realmente teu nascimento foi permeado pela alegria de tua chegada,como pela certeza que nossos ideais seriam recompensados pela democracia.Hoje o vigor que havia dentro de mim, realmente está de cor acinzetada,mas por acreditar que pessoas como tu, juventude como a de voces trarão ao nosso grande país um arco-iris das cores que todos nós merecemos. QUE BOM QUE ESTA CARTA CHEGUE AS MÃOS DE NOSSO(A) FUTURO(A)GOVERNANTE, QUEM SABE OS PUXÕES DE ORELHA SURTAM EFEITO....QUEM SABE...