quarta-feira, 7 de julho de 2010

O beijo de Galeano

Foto: Nauro Júnior

Era um sábado como outro qualquer, se não tivesse tocado o meu celular cortando a calma da tarde. Eu não imaginava que a partir daquele telefonema, começaria a trajetória de um encontro que jamais imaginei ter, mesmo que com 650 quilômetros de distância entre os protagonistas .

Do outro lado da linha, a chefe do Nauro dizia que ele iria para Montevidéu, para cobrir o clima de euforia do povo uruguaio em função do jogo da semifinal da Copa do Mundo. Eufóricos ficamos nós com a notícia, já que uma cobertura internacional é sempre um presente para um jornalista. Tratamos de agilizar a parte prática da viagem, para que ele embarcasse no TTL de domingo à noite. Passagem na mão, mala pronta, equipamento afiado.

Ele se despediu meio nervoso, parece que prevendo que aquela não seria uma cobertura qualquer. Em Montevidéu o repórter Diogo Oliver o aguardava para traduzirem em texto e imagens a emoção dos seguidores da Celeste. Enquanto isso, eu aqui tratei de tocar a vida, acabar algumas pendências e organizar a rotina da Sofia.

Na segunda-feira, como de costume, acordei cedo e já me conectei à internet para começar o trabalho do dia. Falei rapidinho pelo MSN com o Nauro, que tinha chegado bem e estava tomando pé das coisas por lá. Seguimos cada um no seu curso, até que pelas 11h ele me chama de novo.

- Sabes quem vamos entrevistar hoje a tarde?

E eu sem a menor idéia e meio sem paciência, fui direto ao assunto.

- Não sei, conta logo.

E ele, sabendo que eu iria ficar maluca, digitou cada sílaba na tela azul:

- Ga-le-a-no!

- O quê? Não acredito, que máximo!!! Ah, como eu queria estar aí. Aiii meu Deus, então manda um beijo meu pra ele, e diz que ele norteou meus passos desde a adolescência. Sou louca por ele!

Não consegui mais trabalhar. Começava a fazer alguma coisa, e quando via estava viajando pelas páginas de “Veias abertas da América latina”. Este, assim como tantos outros livros que sempre inspiraram minha alma. Me perdia pensando no quanto a obra deste grande escritor tinha influenciado as minhas escolhas de vida. Ele e a Isabel Allende sempre foram as minhas adorações literárias. Sou apaixonada pela dupla.

O Galeano tem uma coisa que admiro demais. Ele é fiel a si mesmo. Diz o que pensa, mesmo que de forma irreverente. Está convicto de suas idéias, que sempre condizem com a sua essência. É daquelas pessoas que sentimos orgulho em estar vivendo na mesma época que nós.

Bueno, a entrevista era às 15h, e no final da tarde o Nauro me chama de novo no MSN. Estava totalmente inebriado com aquele momento singular. Para nós, que tanto o admiramos, são instantes mágicos. Então ele começa a descrever detalhes da entrevista, feita em um charmoso café chamado “Café Brasileiro”. O Nauro, ciente de que aquele seria um momento para contar aos nossos netos, gravou toda entrevista com o celular. Papo vai, papo vem, e no final o Nauro conta que sou apaixonada por ele, e que desde jovem leio seus livros. Com àquele jeito único, Galeano responde:


- Coitada da moça, é uma vítima.


O Nauro aproveita e diz que eu mandei um beijo, conforme a recomendação feita a 650 quilômetros de Montevidéu. Foi aí que o grande momento aconteceu. Ele olhou para câmera e disse olhando nos meus olhos:


- Gabriela, Gabriela, que emoção, eu estou lhe enviando um beijo.


E olhou para o Nauro e disse:


- Não sejas ciumento.


O Nauro ainda brincou com ele, que não poderia sentir ciúmes, já que o meu amor por Galeano era anterior ao nosso casamento. Foi quando ele disse:


- Não te preocupes, eu te autorizo a amá-la como se fosse eu!


Gente, depois desse presente eu vou guardar essa Copa do Mundo da África para sempre no meu coração. Não tem hexacampeonato que valha mais do que um beijo do Galeano.


Sinceramente, eu não sei vocês, mas eu... tô levando a taça pra casa!!!!

"A utopia está lá no horizonte. Me aproximo dois passos, ela se afasta dois passos. Caminho dez passos e o horizonte corre dez passos. Por mais que eu caminhe, jamais alcançarei. Para que serve a utopia? Serve para isso: para que eu não deixe de caminhar."

[ Eduardo Galeano ]

2 comentários:

Joca Martins disse...

Simpelsmente indescritível!!!
Beijos pra vocês!!!

Niara de Oliveira disse...

Adorei. Viajei no texto... :)